Seis ministros entenderam que essa dívida declarada, mas não paga, pode
implicar processo criminal por apropriação indébita.
Por Rosanne D'Agostino e Mariana Oliveira, do G1 e da TV Globo — Brasília
12/12/2019 15h50 Atualizado há 34
minutos
O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria
nesta quinta-feira (12/12/2019) para definir que é crime deixar de pagar o Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) já declarado.
Até agora, seis ministros entenderam que essa
dívida declarada, mas não paga pelos empresários, pode implicar processo
criminal por apropriação indébita, com pena de detenção de seis meses a dois
anos e multa.
Todos entenderam que é preciso ser comprovado o
dolo, intenção deliberada de não pagar o tributo (leia
mais sobre os votos dos ministros abaixo).
O julgamento continua, e os demais ministros ainda
precisam apresentar seus votos.
Tribunais no país vêm tomando decisões divergentes
sobre a possibilidade de condenação criminal dos devedores. Por ser declarada,
a dívida não conta como sonegação, por isso, estados começaram a entrar na
Justiça pedindo condenações.
A decisão do Supremo não deve ser obrigatória, mas
deve ser vir de orientação para que demais instâncias analisem os casos.
O julgamento teve início nesta quarta com o voto do
relator, ministro Luís Roberto Barroso, e do ministro Alexandre de Moraes, para
criminalizar a conduta; e do ministro Gilmar Mendes, contrário.
No recurso julgado, um casal de contribuintes de
Santa Catarina alega ter sido alvo de ação penal. Para o relator, ministro Luís
Roberto Barroso, a dívida poderia ser criminalizada se o devedor for
considerado contumaz e agir com dolo.
Também votaram para considerar a conduta crime os
ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Luiz Fux e Cármen Lúcia. O ministro Ricardo
Lewandowski foi contra.
O ICMS é um imposto estadual que incide sobre
operações como compra de mercadorias (alimentos, eletrodomésticos, bebidas
etc.), e é adicionado ao valor do produto adquirido.
Segundo dados encaminhados ao Supremo, em 2018 a
dívida declarada e não paga de ICMS em 22 estados era de mais de R$ 12 bilhões.
Votos dos ministros:
Luiz
Fux
O ministro Luiz Fux foi o primeiro a apresentar
voto nesta quinta, o terceiro por criminalizar a dívida. Segundo o ministro,
números mostram que o prejuízo com a sonegação é maior do que a corrupção no
país. Além disso, disse que empresas milionárias são devedoras.
"Temos dificuldade relativa a necessidade de
fundos para viabilizar o estado a atender essa promessa constitucional,
direitos básicos, educação. Isso decorre da corrupção, vimos no mensalão,
depois no petrolão, mas também por força da sonegação", afirmou.
Edson
Fachin
O ministro Edson Fachin foi o quarto ministro a
votar pela criminalização da dívida, seguindo entendimento do relator, ministro
Luís Roberto Barroso.
Em seu voto, o ministro afirmou que a punição não
ocorrerá pelo simples não recolhimento do tributo e caberá a cada juiz avaliar
as hipóteses em que houve intenção de não arcar com as dívidas caso a caso.
"A ausência de pagamento não denota apenas e
tão somente inadimplemento, mas sim, disposição de recursos de terceiros,
aproximando-se de uma espécie de apropriação tributária, aspecto que a meu ver
fulmina o cerne das teses defensivas", disse.
Rosa
Weber
A ministra Rosa Weber também votou para que a
dívida seja considerada como crime, mas apenas na modalidade dolosa, e não
culposa.
"Eu entendo que o acórdão recorrido em
absoluto revela constrangimento ilegal", afirmou a ministra sobre o caso
de Santa Catarina. "Concluo pela tipificação abstrata quando o
contribuinte deixa de recolher no prazo legal", afirmou.
Segundo Rosa Weber, isso alcança "tanto aquele
que retém na fonte tributo e deixa de recolhê-lo, como aquele que cobra como
contribuinte de direito o valor dos tributos indiretos e possivelmente deixa de
recolher aos cofres do titular". "O delito não comporta a modalidade
culposa", completou.
Cármen
Lúcia
A ministra Cármen Lúcia votou para criminalizar a
dívida. Segundo a ministra, é necessária a comprovação da intenção de não
pagar.
"Não há neste caso nada que possa ser
considerado como indevido ou ilegal ou que configure constrangimento",
afirmou a ministra.
Ricardo
Lewandowski
O ministro Ricardo Lewandowski votou contra
considerar crime esse tipo de dívida.
"Não me impressionam os dados de que a Fazenda
Pública estaria desguarnecida de instrumentos para cobrar os sonegadores",
afirmou o ministro. "Ela está plenamente aparelhada."
Votos apresentados na quarta (11):
Luís
Roberto Barroso
Primeiro a votar, o ministro Luís Roberto Barroso,
afirmou que crimes tributários não podem ser considerados "de pouca
importância".
Relator do caso, ele afirmou que esses crimes
"privam o Estado brasileiro de recursos necessários para acudir as
demandas da sociedade".
"Se o sujeito furtar uma caixa de sabão em pó
no supermercado o direito penal é severo. Penso que quando há crime tributário
deve ser igualmente sério. Tratar diferente furto da sonegação dolosa faz parte
da seletividade do dinheiro brasileiro que considera que crime de pobre é mais
grave do que crime de rico", disse o ministro ao votar pela possibilidade
de criminalizar a dívida.
Para o relator, no entanto, é
"imprescindível" que se demonstre a intenção de não pagar. "Se
for capaz de demonstrar insolvência, não há dolo, por exemplo. É preciso olhar
no caso concreto o comerciante que enfrenta dificuldade ou aquele inadimplente
contumaz, que faz da inadimplência tributária o modus operandi", afirmou.
Alexandre
de Moraes
Alexandre de Moraes concordou com Barroso.
"Existem duas formas de se combater a sonegação fiscal: a brasileira e a
correta. No Brasil, nem se pedir pra ser preso um sonegador vai conseguir . É
mais arriscado jogar na roleta em Las Vegas do que sonegar imposto no
Brasil", disse Moraes.
"Infelizmente, sonegar acaba dando bons
resultados para a empresa", completou Moraes.
Gilmar
Mendes
O ministro Gilmar Mendes votou contra a possibilidade
de criminalização da dívida. "A norma penal repele responder com tipo
penal pagamento de divida. Só é permitido em caso de fraude", destacou.
"Num cotejo analítico, na qualidade de bem
jurídico tutelado, a intervenção criminal só se justifica na medida que houver
fraude pelo agente. Na falta de tal elemento, resta cristalino o vilipêndio da
criminalização do mero inadimplemento", considerou Mendes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Favor informar seu email para obter sua resposta.