Mentir no currículo ou em uma entrevista de emprego pode gerar demissão por justa causa - mesmo que tenham se passado anos da contratação.
Juízes vêm entendendo que vale, para esses casos, a data em que o empregador descobriu ter sido enganado. Em um caso julgado recentemente pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Campinas (SP), por exemplo, o funcionário demitido tinha mais de dez anos de casa.
A empresa descobriu por meio de uma denúncia anônima que o funcionário não havia concluído o segundo grau, um dos requisitos para a vaga que ocupava. Pior do que isso: além de mentir no processo de seleção, apresentou, na contratação, um certificado escolar falso.
O funcionário trabalhava como operador de máquinas. Havia entrado na empresa em 2007 e foi dispensado no ano passado. A demissão ocorreu durante período em que ele estava afastado das atividades por licença médica- condição que, sem motivos para a justa causa, o colocaria em situação de estabilidade.
Ele ingressou com ação na Justiça pedindo para ser reintegrado, ter restabelecido o convênio médico e restituído o pagamento do salário e demais benefícios. Conseguiu, por meio de liminar, na primeira instância. A empresa, no entanto, reverteu a decisão no tribunal.
Relator do caso, o desembargador Manuel Soares Ferreira Carradita, da 2ª Seção de Dissídios Individuais do TRT de Campinas, interpretou o fato como sendo de "extrema gravidade". A questão da justa causa, afirma na decisão, se dá pela quebra de confiança, que é necessária à manutenção do vínculo de emprego (processo nº 0005528-46.2018.5.15.0000).
Com a aplicação da justa causa, o funcionário deixou de receber férias e décimo terceiro proporcionais, além de aviso prévio. Ele também perdeu o direito à multa de 40% sobre o valor de FGTS que havia sido depositado pela companhia durante o tempo de serviço e ainda o de levantar o dinheiro que já estava no fundo.
Ao menos três funcionários de uma outra empresa, que atua no setor metalúrgico, enfrentaram situação semelhante. Eles também foram demitidos por justa causa por mentir que haviam concluído as séries escolares - todos com mais de cinco anos de casa.
Os trabalhadores recorreram ao Judiciário, com pedidos de reintegração aos quadros da companhia e indenização por danos morais, mas já na primeira instância não tiveram sucesso.
Os três casos foram julgados pela Vara do Trabalho de Hortolândia, no interior de São Paulo (processos nº 0010275-05.2017.5.15. 0152, nº 0011005-16.2017.5.15. 0152 e nº 0012301-73.2017.5.15. 0152).
Em uma dessas ações, a juíza Fernanda Constantino de Campos considerou, na decisão, que o funcionário só havia ocupado o cargo na empresa por causa da mentira e destacou que o fato de falsificar o certificado poderia ser inclusive tipificado como crime, nos termos dos artigos 297 e 304 do Código Penal.
Uma das questões que chama a atenção em todos esses casos de demissão por justa causa, segundo advogados, é o período entre a contratação, quando o funcionário cometeu a irregularidade, e a data da dispensa. Isso porque um dos requisitos para a justa causa é o princípio da imediatidade. E, nesses casos, os juízes poderiam entender que estaria ligado ao ato e não à descoberta da mentira.
Representante das empresas nos casos julgados, o advogado Antônio Carlos Frugis, do escritório Demarest, chama atenção que as companhias abriram sindicância interna assim que souberam das mentiras e aplicaram a justa causa no mesmo dia em que obtiveram respostas das instituições de ensino que constavam na documentação dos funcionários - estando, assim, em acordo com a imediatidade exigida para esse tipo de dispensa.
"O que vale é o conhecimento do ato faltoso", diz Frugis. "E foi isso que o Judiciário entendeu. A imediatidade não é o momento em que você admite o funcionário. É o momento em que você descobre efetivamente que foi enganado", acrescenta o advogado.
Fonte: Valor Econômico
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